A Fuga para Abissínia

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27/05/2020

As dificuldades e sofrimentos suportados por muçulmanos estavam sempre a aumentar.

O Profeta de Allah (Sallalláho Alaihi Wa Sallam) autorizou-os finalmente a emigrar para outros locais.

 

Na altura, a Abissínia era governada por um rei cristão (que mais tarde abraçou o Islam), famoso pela sua Misericórdia.

Em Rajab, no ano 5 da missão, o primeiro grupo composto por cerca de 12 homens e 5 mulheres emigrou para a Abissínia. Os Quraishitas perseguiram-nos até ao porto para os capturar, mas os barcos já tinham deixado a costa. Quando chegaram a Abissínia ouviram o rumor que toda a tribo Quraishita tinha abraçado Islam. Naturalmente, muito contentes com a notícia, regressaram ao seu país. Ao aproximarem-se de Makkah tiveram o conhecimento que era falso rumor e as perseguições eram constantes.

Alguns decidiram regressar à Abissínia e outros entraram em Makkah, procurando proteção de algumas pessoas poderosas (ou influentes). Esta é conhecida como a primeira fuga para Abissínia. Mais tarde, um grupo maior, de 83 homens e 18 mulheres emigrou para Abissínia (separadamente). Esta é conhecida como a segunda fuga para aquele país. Alguns companheiros tomaram parte em ambas as fugas. Os Quraishitas não gostaram das emigrações e o simples fato de pensarem na paz conseguida pelos fugitivos, não lhes dava sossego. Enviaram uma delegação para Abissínia com belos presentes para o rei, sua corte e o seu clero. A delegação encontrou primeiro com os chefes e o membros do clero e, oferecendo-lhes presentes, obtiveram sucesso, atraindo os oficiais da corte para o seu lado, abrindo assim o caminho para a corte real. Prostraram-se diante do rei e, depois de lhe oferecerem os presentes, apresentaram o seu caso. Disseram: “Ó Rei! Alguns rapazes loucos da nossa comunidade renunciaram a sua fé ancestral e juntaram-se a uma religião absolutamente nova que é oposta à nossa, bem como à vossa religião. Eles vieram fixar-se no vosso país. A Nobreza de Makkah, os seus próprios pais e parentes, amigos e familiares mandaram-nos levá-los de volta para o país deles. Nós suplicamos que os entregue a nós.”

O rei replicou: “Nós não podemos entregar aqueles que procuram o nosso abrigo sem uma investigação conveniente. Chamemos à nossa presença e ouçamo-los. Se a vossa acusação de apostasia (renegar a religião) contra eles é verdadeira, cedê-los-emos a vós”. O rei imediatamente convocou os muçulmanos para a sua corte. A princípio, eles estavam muito aflitos e não sabiam o que fazer, mas Allah deu-lhes coragem e eles decidiram ir e relatar os fatos e os atos penosos perante o rei. Quando apareceram diante dele, cumprimentaram-no com o Salam (disseram-lhe: “Assalamu Alaikum”).

Alguém entre os cortesãos protestou dizendo que eles não se tinham prostrado perante o rei, de acordo com as regras da terra. Os muçulmanos explicaram: “O nosso Profeta (Sallalláho Alaihi Wa Sallam) proibiu-nos de prostrar diante de quem quer que seja, exceto Allah.” Então o rei pediu-lhes para exporem a sua defesa contra as acusações que lhes eram feitas, Ja’far levantou-se e dirigiu-se ao rei nesses termos:
Ó Rei! Nós éramos um povo ignorante, não conhecíamos nem Allah nem os Seus Profetas. Adorávamos pedras. Costumávamos comer carne podre e cometer todas as espécies de atos indesejáveis e vergonhosos. Não cumpríamos as nossas obrigações para com os nossos parentes. O forte entre nós prosperava à custa dos fracos. Então, finalmente, Allah enviou um Profeta para a nossa reforma. A sua nobre descendência, conduta, integridade na intenção e pureza de vida são mais conhecidas entre nós.

Ele pediu-nos para adorar Allah e exortou-nos a deixar a idolatria e o culto das pedras. Ordenou-nos a conduta reta e proibiu-nos a obscenidade. Ensinou-nos a falar verdade, a provar a nossa fé, a respeitar os nossos pais e a ser bons com nossos vizinhos. Dele aprendemos a observar Salát, jejum, Zakat e a boa conduta, a evitar todas as loucuras e derramamentos de sangue (chacinas). Proibiu-nos o adultério, a sensualidade, a mentira, o desvio da herança dos órfãos, o levantamento de falsos testemunhos contra outros e todas as coisas indecentes daquela espécie. Ensinou-nos o Sagrado Qur’an, o maravilhoso livro de Allah. Assim, nós acreditamos nele, seguimo-lo e atuamos de acordo com a sua doutrina. E então o nosso povo começou a perseguir-nos e submeter-nos às torturas, pensando que renunciaríamos à nossa fé e voltaríamos à idolatria. Quando, porém, as suas crueldades ultrapassaram todos os limites, nós abrigamo-nos no vosso país, com a permissão do nosso Profeta (Sallalláho Alaihi Wa Sallam).

O Rei disse: “Ouçamos alguma coisa do Qur’an, que o vosso profeta vos ensinou.” Ja’far (Radiyalláho Anhu) recitou alguns versículos do começo do capítulo ‘Maryam’ (Maria – Cap.:19) que comoveu de tal modo o Rei e a classe sacerdotal que as lágrimas deslizavam pelas suas faces molhando as suas barbas. O Rei replicou: “Por Allah, estas palavras e as que foram reveladas ao Profeta Moisés (Alaihi Salam) são raios da mesma luz.” Disse à embaixada Quraishita que, de maneira alguma ele devolveria os emigrados no seu país. Vendo-se frustrados e desonrados, os Quraishitas convocaram um conselho e um deles disse: “Tenho um plano que, de certeza, atrairá a fúria do Rei contra eles.” Embora os outros não concordassem com tão drástica idéia (porque afinal de contas eles eram a sua própria carne e sangue), ele não os escutou. No dia seguinte, eles excitaram o Rei, dizendo-lhe que aqueles hereges denunciavam ‘Issa (Jesus – Sallalláho Alaihi Wa Sallam) e não acreditavam na sua Divindade. Os muçulmanos foram novamente convocados para a corte. Estavam muito mais aflitos desta vez. Quando o Rei inquiriu acerca da fé em Issá (Jesus-Sallalláho Alaihi Wa Sallam), eles responderam: “Nós acreditamos no que Allah revelou, à cerca dele, ao nosso Profeta (Sallalláho Alaihi Wa Sallam), isto é, ele é um Servo e Profeta de Allah e sua Palavra, que ele transmitiu à virgem e inocente Maryam.”

Negos (Rei) disse: “Issá ( Jesus-Sallalláho Alaihi Wa Sallam) não disse nada para além disso.” Os padres começaram a murmurar em protesto, mas o rei não os quis escutar. Devolveu à delegação os presentes que tinham trazido para ele e disse aos muçulmanos: “Ide e vivei em paz. Se alguém vos maltratar, pagará caro por isso.” Para o efeito, foi também emitida uma declaração real. Isto aumentou o prestígio dos muçulmanos no país e a delegação Quraishita teve de voltar desanimada. Este fracasso da Embaixada Quraishita na Abissínia e os triunfos dos muçulmanos sobre eles, conduziram a um incremento na exasperação (irritação) dos idólatras.

A conversão de Umar ao Islam acrescentou mais combustível ao fogo. Eles ficaram ainda mais ressentidos. As coisas chegaram ao ponto que um grande número de chefes Quraishitas conspirou para matar, imediatamente, Muhammad (Sallalláho Alaihi Wa Sallam) e tratar de todos os assuntos sumariamente. Mas isto não era fácil. Bani Hashim, tribo a que Profeta (Sallalláho Alaihi Wa Sallam) pertencia, era forte em número e ainda mais em influência. Embora nem todos fossem muçulmanos, até os não muçulmanos, entre eles, não podiam concordar em tolerar o assassinato do Profeta.

Os Quraishitas decidiram, portanto, fazer um bloqueio social ao clã Bani Hashim e aos seus chefes.  Redigiram um documento para o efeito, o qual dizia que nenhum deles, ou as suas tribos, poderiam associar-se, comprar ou vender àqueles que apoiavam o clã de Bani Hashim, até que eles entregassem Muhammad (Sallalláho Alaihi Wa Sallam) para a pena de morte.

Todos eles aceitaram este documento no primeiro dia do mês de Muharram do sétimo ano da missão e o rolo de papel foi pendurado no Ka’bah, para lhe dar maior santidade. Então, três longos anos, o Profeta de Allah (Sallalláho Alaihi Wa Sallam) ficou isolado com toda a família no vale, que era subseção duma das gargantas que se estendem até Makkah. Durante três longos anos ninguém os podia ver e nem eles podiam ver alguém. Não podiam comprar qualquer coisa em Makkah e nem a nenhum comerciante do exterior. Se alguém fosse encontrado fora da prisão, era espancado cruelmente e se pedisse alguma coisa, recusavam-na categoricamente. Em pouco tempo, as provisões de comida esgotaram-se e eles ficaram reduzidos a escassas rações.

As suas mulheres, as crianças e principalmente as crianças de peito choravam de fome e isto era mais penoso para eles do que a sua própria fome. Durante a última parte deste período, a sua única subsistência era a pouca comida, que os maridos das Háshemitas ( da tribo de Bani Hashim), casadas noutras tribos, conseguiram passar para dentro do vale, na escuridão da noite. Por último, graças a Allah, depois de três anos, o rolo de papel foi consumido pelas formigas e a proibição foi removida. A severidade das aflições que eles suportaram, durante este período do ostracismo, não pode ser imaginada. Mas os Sahabah (companheiros) não só permaneceram firmes na fé (Imán), como também conservaram-se ativos na difusão da luz do Islam, entre os seus camaradas de desgraça.

Vejamos como os Sahabah sofreram no caminho de Allah e pela causa do Islam.

Nós pretendemos seguir os seus passos e sonhamos com o progresso material e elevação espiritual que eles conseguiram, mas quanto é que temos sofrido pela verdadeira causa?

Que sacrifício temos feito por amor a Allah, no Seu caminho?

O sucesso é diretamente proporcional ao sacrifício. Nós desejamos viver no luxo e conforto e somos demasiado ambiciosos em competir ombro a ombro com os não muçulmanos no gozo dos prazeres deste mundo, esquecendo a outra vida e, depois, mesmo assim, esperamos receber a mesma ajuda que os Sahabah (companheiros) receberam de Allah, no seu tempo. Não podemos iludir a ninguém, a não ser a nós próprios, com isso.

“Ó Passageiro, não conseguirás chegar a Ka’bah, porque o caminho que tu encaminhas é do Turquistão.”