Os Direitos dos Serventes e Empregados na Civilização Islâmica

Os Direitos dos Serventes e Empregados na Civilização Islâmica

Dr. Ragueb El Serjani

Tradução: Sh. Ahmad Mazloum

 

O Islam enobreceu os serventes e empregados, deu-lhes assistência e reconheceu os seus direitos pela primeira vez na história – quando o trabalho em algumas leis antigas significava escravidão e dependência e em outras leis significava humilhação e desonra -, objetivando com isso o estabelecimento da justiça social e proporcionar uma vida digna para eles. A biografia do mensageiro (a paz esteja com ele) é o melhor testemunho da grandeza da visão da civilização islâmica sobre os empregados e é um reconhecimento dele aos seus direitos. 

O profeta (a paz esteja com ele) ordenou os empregadores a tratarem os seus empregados de forma nobre, a terem compaixão e reconhecimento por eles, e a não sobrecarregá-los com trabalhos acima de suas capacidades. Disse o profeta (a paz esteja com ele):

 

Vossos irmãos são vossos empregados, Allah os deixou sob vossas mãos, assim, quem tiver o seu irmão subordinado a ele que o alimente daquilo com o qual se alimenta, e que o vista daquilo que veste, e que não os encarreguem aquilo que não suportam, e se os encarregarem auxilie-os[1].

                                                              

O profeta (a paz esteja com ele) declarou: “Vossos irmãos são vossos empregados”, para elevar o nível de empregado para o nível de irmão! Isso jamais ocorreu em uma civilização anterior.

 

O mensageiro (a paz esteja com ele) também obrigou o empregador a pagar o  trabalhador e empregado o salário equivalente ao seu empenho sem injustiça ou atraso. Disse: “Concedam ao empregado o seu salário antes de secar o seu suor”[2].

O Islam também alertou sobre a injustiça contra os trabalhadores, o profeta (a paz esteja com ele) disse no hadith narrado da palavra do Senhor da Glória, exaltado seja: “Disse Allah, o Altíssimo: ‘Eu serei rival de três no dia da ressurreição... e um homem que contratou um empregado, usufruiu dele e não lhe deu o seu salário’”[3]. Para que todo indivíduo que cometeu injustiça contra um trabalhador ou empregado saiba que Allah é Conhecedor do que fez e rival dele no dia da ressurreição.

Também é dever do empregador não sobrecarregar excessivamente o trabalhador de maneira a prejudicar a sua saúde e torná-lo incapaz de trabalhar. Sobre isso, o mensageiro de Allah (a paz esteja com ele) disse: “Aquilo que tu amenizares de trabalho sobre o seu servente tornar-se-á recompensa para ti em tua balança”[4].

Dentre os direitos considerados uma marca iluminada na lei islâmica, temos o direito de humildade para com ele, sobre isso o profeta (a paz esteja com ele) incentiva: “Não se ostenta quem seu servente come junto com ele, monta sobre o asno no mercado e amarra a ovelha e ordenha o seu leite”[5].

A vida do profeta (a paz esteja com ele) foi uma aplicação daquilo que ele dizia, por isso Áíshah narra: “Jamais o mensageiro de Allah (a paz esteja com ele) bateu algo com sua mão, nem uma mulher, nem um servente...”[6].

Também observamos o profeta (a paz esteja com ele) dizer a Abu Mass´úd Al Anssari quando este espancava seu servo: “Fique sabendo Abu Mass´úd, que Allah tem mais poder sobre você de que você sobre o jovem”. Abu Mass´úd disse:

 

Olhei e vi que era o profeta (a paz esteja com ele) e disse-lhe: “Ó mensageiro de Allah, ele é livre pela causa de Allah”. O mensageiro (a paz esteja com ele) disse: “Se você não fizesse isso, seria envolvido pelo fogo”, ou disse “tocado pelo fogo”[7].

 

Bater, espancar ou chutar, tudo isso é uma humilhação para o servo recusada por Allah e por Seu mensageiro (a paz esteja com ele). Por isso, a pior punição para o senhor intransigente é que ele seja privado imediatamente de sua posse, esta é a grandeza do Islam e da civilização islâmica. E este é Anass ibn Malik, o servente do mensageiro de Allah, faz um testemunho de verdade e sinceridade dizendo:

 

“O mensageiro de Allah (a paz esteja com ele) era a melhor pessoa em conduta, certo dia, me enviou num serviço. Eu disse: “Juro que não vou” e tinha em meu íntimo ir cumprir o que o profeta de Allah (a paz esteja com ele) me ordenou. Então, sai para passar pelos meninos que brincavam no mercado e eis o mensageiro de Allah (a paz esteja com ele) segurando-me por meus ombros atrás de mim, olhei para ele e estava a rir e, então disse: “Ó Unaiss, vá para onde te ordenei”. Eu disse: “Sim, eu vou ó mensageiro de Allah (a paz esteja com ele)”. Ao fazer esta narração, Anas disse: “Juro por Allah! Eu servi a ele sete ou nove anos, não conheço que tenha dito a mim por algo que fiz: por que fez tal e tal, nem por algo que deixei de fazer: por que não fez tal e tal””[8].

 

E ainda, o mensageiro (a paz esteja com ele) se preocupava na assistência aos seus serventes a ponto de zelar em casá-los. Rabi´áh ibn K´áab Al Asslami disse:

 

Eu servia ao profeta (a paz esteja com ele) e ele certo dia me disse: “Rabi´áh, você não quer casar?” Eu disse: Não, ó mensageiro de Allah, não quero casar, não tenho com que manter uma mulher e não quero que nada me ocupe de ti. Então, ele me deixou e, depois disso, disse-me: “Rabi´áh, você não quer casar?” Eu disse: Não, ó mensageiro de Allah, não quero casar, não tenho com que manter uma mulher e não quero que nada me ocupe de ti. Então, ele me deixou. Em seguida, revisei o meu íntimo e disse: “Juro por Allah, ó mensageiro de Allah, o senhor é mais conhecedor do que me beneficia na vida mundana e na Vida Eterna. E eu dizia dentro de mim: “Se ele me perguntar pela terceira vez, responderei que sim”. Então, ele me disse pela terceira vez: “Rabi´áh, você não quer casar?” Eu, então, respondi: “Sim, ó mensageiro de Allah, ordene-me o que quiser, ou o que lhe agrada”. Ele disse: “Vá até família de Fulano, num bairro dos Anssar...”[9].

 

A grandeza da civilização islâmica no trato aos serventes e trabalhadores também se manifesta quando vemos a misericórdia do profeta (a paz esteja com ele) com seus serventes se estendendo para abranger até mesmo os que não crêem no Islam. Um menino judeu que trabalhava como seu servo adoeceu gravemente, o profeta (a paz esteja com ele) o visitava repetidamente até quando se aproximava da morte, o profeta (a paz esteja com ele) o visitou e sentou frente à sua cabeça e o convidou para o Islam. O menino olhou para o seu pai perguntando, então, seu pai disse: “Atenda a Abul Qassim (o profeta)”. O menino tornou-se muçulmano e, em seguida, sua alma saiu. O profeta (a paz esteja com ele) saiu da casa dizendo: “Louvor a Allah, que o salvou através de mim do Inferno”[10].

Estes são apenas alguns direitos dos serventes e trabalhadores que o Islam decretou e que o nobre mensageiro do Islam (a paz esteja com ele) aplicou com palavras e na prática, numa época em que só era conhecida a injustiça, a opressão e a tirania... para expressar verdadeiramente a que nível chegaram civilização islâmica e os muçulmanos em alteza, grandeza e humanidade.

 


[1] Narrado por Al-Bukhari, capítulo de Al-Iman (fé) (30), e Muslim, o capítulo de Al-Aiman wa Al-Nuzhur (juramentos) (1661).

[2] Narrado por Ibn Majah sobre a autoridade de Abdullah Ibn Umar (2443). Al-Albani disse: correta, veja: Mishkat Al-Masabih (2987).

[3] Narrado por Al-Bukhari sobre a autoridade de Abu-Hurairah, capítulo de Al-Buiu’(vendas) (2114), Majah Ibn (2442), e Abu-Ya'la (6436).

[4] Narrado por Ibn Hibban sobre a autoridade do Amr ibn Huraith (4314), e Abu-Ya'la (1472). Salim Hussein Assad disse: seus transmissores são de confiança.

[5] Narrado por Al-Bukhari: Al-Adab Al-Mufrad 2 / 321 (568) e Al-Baihaqi: Shu'ab Iman Al-(8188). Al-Albani disse: correta, veja: Sahih Al-Jami'(5527).

[6] Narrado por Muslim, capítulo de Al-Fada'il (qualidades) (2328), de Abu Daud (4786) e Ibn Majah (1984).

[7] Narrado por Muslim, capítulo de Al-Iman (1659), Abu-Daud (5159), Al-Tirmizi (1948), Alves (22.404), Al-Bukhari: Al-Adab Al-Mufrad 1 / 264 (173 ), e Al-Tabarani: Al- Mu'jam Al-Kabir (683).

[8] Narrado por Muslim, capítulo de Al-Fada'il (2310), e Abu Daud (4773).

[9] Narrado por Ahmad (16.627), Al-Hakim (2718), que disse: este é um hadith correto, de acordo com as condições de Muslim, e Al-Tayalisi (1173).

[10] Narrado por Al Bukhari sobre a autoridade de Anas ibn Malik: Capítulo de Al-Janaíz (funerais) (1290).