A autoridade do profeta

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30/05/2020

O alcance da autoridade do Profeta Mohammad (saw) está limitado apenas a questões doutrinárias e de adoração, e não a questões materiais? Em alguns círculos ocidentais, entende-se que a função do Profeta (saw) se restringe a corrigir as questões doutrinárias da ummah e a ensinar como adorar a Deus.

De acordo com eles, as questões mundanas não são da competência profética. No entanto, a autoridade do Profeta (saw) está claramente estabelecida no Alcorão para todas as pessoas e para todas as épocas.

 

Na opinião daqueles que limitam o alcance da autoridade dos profetas, as questões materiais incluem todos os assuntos econômicos, sociais e políticos, e devem ser determinados de acordo com a experiência de cada época, e a autoridade profética não tem que se ocupar deles. Mesmo que o Profeta (saw) desse alguma orientação a respeito desses assuntos, ele o fazia dentro de sua capacidade pessoal e não como um mensageiro. Portanto, não é necessário que a ummah obedeça àquelas orientações.

Um relato que muitas vezes é citado equivocadamente para amparar a visão falaciosa exposta acima, vem do Imam Muslim: “O abençoado companheiro Talha (ra) disse: eu estava com o Profeta (saw) e cruzamos com algumas pessoas que estavam debaixo de umas palmeiras. O Profeta (saw) perguntou: O que eles estão fazendo? Estão fecundando a árvore. Eles inserem o masculino e o feminino e fecundam a árvore. O Profeta (saw) disse, não acho que isto tenha alguma utilidade.

Quando souberam o que o Profeta tinha dito, interromperam a operação. Ao saber da desistência, o Profeta (saw) disse: Se de fato for útil para eles então que o façam, porque eu apenas fiz uma suposição. Portanto, não se prendam às minhas suposições. Mas, quando eu disser alguma coisa em nome de Deus, peguem firme, porque jamais direi uma mentira em nome de Deus. Além disso, de acordo com Anas (ra), o Profeta (saw) também disse naquela ocasião: Vocês conhecem melhor suas questões mundanas.”

Se a ummah tivesse entendido esse hadith literalmente, o Islam, assim como algumas outras religiões, teria ficado limitado a doutrina e rituais e não se ocuparia das questões do dia-a-dia dos seres humanos. Uma vez observados os rituais e doutrina prescritos, o homem é livre para levar sua vida da forma que desejar, não sendo impedido de maneira alguma pelos imperativos divinos. No entanto, é ponto pacífico que o Islam, diferentemente de outras religiões que coexistem com conceitos de vida seculares, não é só um conjunto de doutrinas e rituais. O Islam é um sistema completo de vida, que lida com problemas políticos, econômicos e sociais e com as questões teológicas também. Allah diz no Alcorão: “Ó fiéis, atendei a Deus e ao Mensageiro, quando ele vos convocar à salvação.” (8:24)

Existem inúmeros aspectos de nosso cotidiano que não estão comentados diretamente no Alcorão e na Sunnah, onde as pessoas têm a permissão de proceder de acordo com suas necessidades, baseadas no seu conhecimento e experiência. No entanto, as questões que não são diretamente tratadas no Alcorão e na Sunnah, o muçulmano precisa alinhar sua decisão com os princípios existentes encontrados em ambos, para assegurar que ele se oriente islamicamente no desempenho daquela questão, e mais importante, evitando o pecado maior de cometer shirk.

Porque se Deus e Seu Mensageiro (saw) estão chamando para a salvação, é preciso que as questões relativas à vida estejam totalmente dentro da jurisdição de Deus e de Seu Mensageiro (saw). De outro modo, seremos sempre presas dos desejos satânicos que nos conduzem para o desastre.

Além do mais, ninguém que tenha estudado o Alcorão pode aceitar que seus ensinamentos estejam limitados à adoração e aos rituais apenas. Existem injunções específicas no Alcorão sobre vendas, compras, empréstimos, prestações, associações, leis penais, herança, relações matrimoniais, políticas, sociais e familiares, problemas de guerra e paz, e outros aspectos concernentes à vida mundana. Da mesma forma, a Sunnah do Profeta (saw) também lida com problemas econômicos, sociais, políticos e legais tão detalhadamente que vários livros foram escritos para compilá-los. As injunções do Alcorão e da Sunnah neste campo (questões mundanas) são tão absolutas, imperativas e de natureza obrigatória, que não se pode imaginar que se tratem de conselhos pessoais, sem qualquer referência (divina) legal.

Por último, existem inúmeros versículos do Alcorão que obrigam os crentes a obedecerem a Deus e à autoridade do Mensageiro(saw), em particular o capítulo 4, versículo 65, que diz: “Qual! Por teu Senhor, não crerão até que te tomem por juiz de suas dissensões e não objetem ao que tu tenhas sentenciado.”

Portanto, aceitar a falácia de que a autoridade dos profetas não se estende aos assuntos mundanos é condenar a segunda fonte da Lei Islâmica, a Sunnah. A autoridade da Sunnah é baseada na revelação que o Profeta (saw) recebeu de Deus. Em parte alguma esta obediência ao Profeta (saw) está limitada a uma determinada área. É uma obediência completa, que exige submissão total dos crentes, sem exceção, que não limita seu alcance e nem exclui as questões materiais de sua finalidade.

A Sunnah como fator de decisão

Uma das maiores calamidades que atingem os muçulmanos de hoje, sejam pessoas comuns ou aqueles que são considerados instruídos, é a falta de conhecimento da Sunnah na decisão de questões para si ou para a orientação dos outros. Como muçulmanos, a decisão de viver nossa vida diária foi facilitada porque somos ajudados divinamente pelo Alcorão e pela Sunnah (ditos, atos ou a aprovação de um dito ou um ato pelo Profeta Mohammad). Anas relatou que o Mensageiro de Allah (saw) disse: “Deixei para vocês duas coisas (que se forem pegadas logo) jamais os desviarão (assim que vocês as peguem): O Livro de Allah e a minha Sunnah. Eles não se separarão até se encontrarem comigo no Hawdh (o rio do Paraíso que corre fora dos portões do Paraíso).” (Malik & Al-Hakim)

Além do mais, está claro no Alcorão que Allah orientou todos os muçulmanos a buscarem amparo n’Ele e no Profeta (saw): “Ó fiéis, obedecei a Deus, ao Mensageiro e às autoridades, dentre vós! Se disputardes sobre qualquer questão, recorrei a Deus e ao Mensageiro, se crerdes em Deus e no Dia do Juízo Final, porque isso vos será preferível e de melhor alvitre.” (4:59)

Que caminho tomar?

Os muçulmanos devem continuar a seguir os passos dos Companheiros do Profeta (ra), porque eles observavam o conhecimento em todos os aspectos de suas vidas, aplicando o que o Profeta dizia ou fazia. O Profeta (saw) instruiu seus seguidores a tornar sua Sunnah conhecida o máximo possível, cuidando para que nada nela fosse falso. Ele (saw) pediu a seus seguidores que adquirissem o conhecimento e ensinassem aos outros. Em seu sermão da despedida, o Profeta (saw) declarou: “Transmitam aos outros, nem que seja um único versículo.” Assim, os Companheiros (ra) viam o conhecimento da Sunnah como um legado sagrado que deveria ser transmitido aos outros e praticado por eles mesmos.

Existem inúmeros exemplos dos Companheiros (ra), que mostram como eles cumpriam rigorosamente a Sunnah do Profeta (saw), além de fazerem longas e penosas viagens para conseguir um único hadith. Tão grande era a ligação e dedicação dos Companheiros (ra) à Sunnah e com tão intenso zelo e devoção seguiam o Profeta, que se eles vissem alguém ignorando ou se desviando da Sunnah, eles exortavam a pessoa a orientar-se por ela. A história registrou que certa vez Abdullah bin Umar (ra), que é conhecido por seu apego à Sunnah, viu seu filho impedindo a esposa de ir à mesquita. Omar disse: Não faça isso porque o Mensageiro de Allah (saw) disse: “Não impeça as servas de Deus de entrarem nas Casas de Allah”. Bilal foi inflexível porque ele continuou proibindo, mesmo depois de ter ouvido isto. Ibn Omar (ra) ficou tão aborrecido que jurou nunca mais falar com ele até o dia de sua morte.

Pedir Prova

Ao seguir a Sunnah, podem

existir muitos exemplos onde alguém nos conta algo ou pratica uma certa ação e diz que está certo fazer isto, ou que é Sunnah, e talvez até mencione um hadith. Em qualquer caso, ou se tivermos alguma dúvida a respeito da fonte, é aceitável que se peça a prova. Certa vez Abu Musa (ra) pediu permissão para entrar na casa de Omar (ra), mas vendo que ele estava ocupado, foi embora. Então Omar disse: “Não ouvi a voz de Abdullah bin Qais? Faça-o entrar”. Ele foi chamado e Omar lhe disse: “O que o fez agir assim?” Ele respondeu: “Fomos instruídos (isto é, ir embora após pedir permissão por três vezes sem obter resposta) assim pelo Profeta”. Omar disse: “Traga a prova (testemunha) disto.” Então, Abdullah bin Qais foi a um grupo de ansars que disseram: “O mais novo de nós prestará testemunho disso”. Então, Abu Said Al-Khudri (ra) levantou-se e disse: “Nós fomos instruídos dessa maneira (pelo Profeta). Omar disse: “Eu desconhecia esta tradição do Profeta. Os negócios no mercado me mantinham ocupado.” (Al-Bukhari)

Allah nos orientou a agarrar rápido Sua Corda, isto é, o Islam: “E apegai-vos, todos, ao vínculo com Deus e não vos dividais; recordai-vos das mercês de Deus para convosco, porquanto éreis adversários mútuos e Ele conciliou os vossos corações e, mercê de Sua graça, vos convertestes em verdadeiros irmãos …” (3:103) A Corda de Allah inclui a Sunnah de Seu Mensageiro (saw), como fica evidente nas instruções sobre a prática da oração . Dadas as instruções no Alcorão de que devemos orar, não há instruções sobre como deve ser feita a oração. Sem a Sunnah do Mensageiro de Allah (saw), os muçulmanos discutiriam uns com os outros ou se dividiriam. Portanto, não podemos excluir a Sunnah, que deve ser vista como os laços da Corda do Islam.

Não há dúvida sobre qual é o critério

Os atos do Profeta (saw) eram divinamente inspirados. Assim, a mesma ênfase que damos ao seguir o Mensageiro de Allah (saw) na forma correta de orar, também deve ser dada em todas as nossas decisões diárias. Porque a Sunnah não é para ser encarada como ditos sensatos proferidos por sábios e filósofos, ou sentenças de governantes e líderes. No entanto, devemos acreditar com plena convicção que as palavras e atos do Profeta (saw) representam a vontade de Allah e seguir a Sunnah como os Companheiros o fizeram, que eram vistos como a personificação viva da Sunna,  seremos, da mesma forma, abençoados com o apoio, a orientação e teremos o reconhecimento e a renovação de nossa fé nos mandamentos de Allah: “Não é dado ao fiel, nem à fiel, agir conforme seu arbítrio, quando Deus e Seu Mensageiro é que decidem o assunto. Sabei que quem desobedecer a Deus e ao Seu Mensageiro desviar-se-á evidentemente.” (33:36) Em outras palavras, não seguir a Sunnah do Profeta (saw) não nos garante o apoio de Allah, o socorro, a inspiração para fazer o bem ou a Sua proteção. Aquele que não impõe a Orientação Divina (Alcorão e Sunnah) em sua vida diária, será tomado por Satanás, principalmente se ele conhecer as instruções de Allah e os exemplos do Seu Mensageiro (saw), e personificará a desunião, o ódio, a falta de fraternidade, as diferenças religiosas e as práticas sectárias.

O Profeta ensinou o método de adoração e oração. Ele ensinou a igualdade da humanidade, a justiça correta, os direitos dos trabalhadores e a obediência completa a Allah. Ele explicou e nos mostrou as responsabilidades que um indivíduo tem para consigo mesmo, com seus pais, sua família, seus parentes, seus vizinhos, seus amigos, com outras seitas religiosas, com a sociedade como um todo e com os animais. Ele nos ensinou a forma de nos mantermos seguros, limpos, arrumados, saudáveis e piedosos. Ele nos ensinou a forma correta de conduzir os negócios. Ele nos ensinou os meios corretos de ganharmos o dinheiro e como usá-lo. Ele nos ensinou a sermos bons e educados com os outros. Ele deu detalhes de boas maneiras e decência. Ele também nos mostrou, a partir de seus próprios exemplos, como conversar, andar, lidar com os outros e como nos comportarmos em sociedade. Ele nos mostrou como deveria ser nosso estilo de vida em casa. Ele nos mostrou as formas e métodos de governar nossa sociedade e o mundo.

Em resumo, a Sunna do Profeta (saw) é completa. Ela fala e mostra tudo o que um muçulmano precisa saber para tomar decisões justas em sua vida diária. Não precisamos procurar outras fontes de orientação secular. A Sunnah é uma das fontes preservadas do conhecimento islâmico que deve ser estudada e, mais importante, implementada no dia-a-dia dos muçulmanos. E, finalmente, fomos informados sobre a punição na outra vida para aquele que se recusa a seguir esta orientação. “Aquele que obedece a Allah e a Seu Mensageiro será admitido no Paraíso, onde correm rios, onde habitará e este será o grande êxito. E aquele que desobedece a Allah e a Seu Mensageiro e transgride Seus limites, Ele o lançará no Fogo, onde habitará, e sofrerá um terrível tormento”. (4:13-14)

(Compilado de: The Authority and Authenticity of Hadith as a Source of Islamic Law, por Justice Muhammad Taqi Usmani; The Hadith is Proof Itself in Belief and Laws, de Shaykh Nadir Ad-Din al-Albani; The Way of the Prophet, de Shaykh Muhammad Sadiq; An Introduction to the Sunnah, de Suhaib Hasan, The Study of Al-Quran – Al Quran Society; A Treasury of Hadith, Dr Mazhar U Kazi.)
(Source: Al-Haramain Foundation)

fonte
sbmrj.org.br