Os Árabes antes do Islam
Dr. Ragheb El Serjani
Traducão: Sh. Ahmad Mazloum
Para distinguir a situação dos árabes após o surgimento da mensagem do Islam, tal época que antecedeu o Islam ficou conhecida como “al jahiliah” (época da ignorância), e a história árabe antes do Islam foi denominada “attarikh al jahili” (a história ignorante ou a história da ignorância), com tudo o que esta palavra revela de primitividade e atraso, porque retrocederam na civilização, sendo os últimos entre os povos que os rodeavam. A sua maioria viveu como tribos nômades em ignorância e desatenção, não tinham relações com o mundo externo, e o mundo externo não tinha ligação com eles, analfabetos, adoradores de ídolos, não tinham história rica e marcante”[1].
Os árabes e as nações do mundo
Os árabes se destacaram entre as nações e povos mundiais naquela época ignorante com educação e habilidades com as quais foram únicos, como a lingüística e força de expressão, o amor pela liberdade e o orgulho, a cavalaria e a coragem, o entusiasmo em prol da crença, a franqueza no falar, destreza da memória, força de recordação, amor pela igualdade, força de vontade, cumprimento da promessa e responsabilidade. Se os árabes se destacaram nestas e outras nobres qualidades, por outro lado, por causa da distância deles da época da profecia e dos profetas, também por causa da contração na Península Arábica e da força do apego à religião dos antepassados e às tradições de sua nação, sofreram grave decadência religiosa. Houve desprezível idolatria, cujo similar é difícil de ser encontrado em nações contemporâneas, doenças morais e sociais que fizeram deles uma nação de baixos valores morais, sociedade corrupta, estrutura humilhante, contendo os piores aspectos de uma vida ignorante e distante das benfeitorias das religiões[2].
A crença dos árabes
No aspecto da religião, difundiu-se a adoração aos ídolos na Península Arábica, a ponto de existir em cada tribo e, em seguida, em cada casa um ídolo. O companheiro do Profeta (a paz esteja com ele) Abu Rajá Al Átardi narra: Adorávamos uma pedra, então se encontrássemos uma pedra melhor, jogávamos a primeira e pegávamos a outra, se não encontrássemos pedra alguma juntávamos uma porção de terra e trazíamos ovelhas para ordenhá-las sobre a terra e, em seguida, circundávamos este ídolo[3].
Além dos ídolos de pedra, os árabes idolatravam os anjos, os gênios, as estrelas. Acreditavam que os anjos são filhas de Deus, então os tomavam por intermediários perante Deus e os adoravam. Fizeram dos gênios sócios com Deus e creram que tinham poder e influência e os adoraram[4].
O judaísmo era difundido nas regiões árabes; seus líderes tornaram-se senhores no lugar de Deus, decretavam sobre as pessoas e os julgavam até mesmo sobre os pensamentos da alma e os sussurros dos lábios, tinham como preocupação angariar riquezas e liderança mesmo que a religião se perdesse e se difundisse a apostasia e a incredulidade. Quanto ao cristianismo, tornou-se uma idolatria difícil de ser entendida, criou uma espantosa mistura entre Deus e o ser humano, e não tinha nos íntimos dos árabes religiosos real influência[5].
A ética entre os árabes
No aspecto moral, o ingerir de bebidas alcoólicas era amplamente difundido e fortemente estabelecido a ponto de ocupar grande parte de suas poemas, de sua história e literatura. Da mesma forma, os jogos de azar eram difundidos. Disse Qatadah: “Na jahiliah, o homem apostava sua família e a sua riqueza, triste e desolado, observava os seus bens nas mãos dos outros. Isto criava entre eles ódio e inimizade[6].
Casamento pré-islâmico
As relações com juros eram muitos disseminadas entre os árabes e entre os judeus. Isto tornou-se comum entre eles, a ponto de dizerem: a venda é simplesmente igual aos juros. A natureza humana também decaiu na relação entre o homem e a mulher, o adultério tornou-se costume banal. O homem tinha namoradas, e as mulheres também detinham amantes sem casamento legal. Sobre o retrato do casamento naquela época, Áíshah diz: “A relação na época da jahiliah era de quatro tipos: 1. o casamento conhecido hoje, onde o homem pede ao homem a sua filha (ou quem está sob sua responsabilidade), concede a ela o seu dote e casa-se com ela. 2. o casamento no qual o homem dizia para sua mulher quando esta se purificasse do período menstrual: Envie a Fulano e peça a sua penetração (deite com ele). Então, o marido se distanciava dela até que a gravidez se esclareça daquele homem ao qual ela buscou. Se a gravidez aparecer o marido deitava com ela se desejasse. Fazia isso almejando a esperteza da criança!! Este casamento era denominado: casamento em busca da gravidez. 3. o casamento no qual um grupo de menos de dez homens se reuniam com uma mulher, todos eles praticavam o ato sexual com ela. Então, quando ela engravidava e dava a luz a um filho, algumas noites depois enviava a todos eles para comparecerem - e nenhum podia se negar a reunir-se na presença dela - e dizia a eles: “Vós sabeis o que ocorreu, e ele é teu filho ó Fulano”, indicava pelo nome quem ela desejasse e o filho era atribuído a ele e não podia negar. 4. uma mulher colocava um estandarte na porta de sua casa, e vários homens deitavam-se com esta mulher que se prostituía e não negava a entrada de ninguém que viesse até ela. Ao engravidar e dar a luz a um filho, todos os homens eram reunidos e era convocado “al qafah”1 (especialistas que conhecem as semelhanças do filho ao seu pai através de sinais ocultos), em seguida, atribuíam o filho a quem eles sentenciassem, e era conhecido como seu filho sem poder negar”[7].
As mulheres na época pré-islâmica
Quanto à situação da mulher, Omar ibn Al Khattab a resumiu dizendo: “Juro por Allah, na jahiliah não considerávamos a mulher, até o dia em que Allah revelou sobre elas o que revelou”. A mulher não tinha direito a herança, diziam: “Só nos herda quem carrega a espada e defende a honra”. Se um homem morria, o seu filho o herdava, se não tivesse filho então seu pai, irmão ou tio, e as filhas e esposas destes eram unidas às filhas e esposas de quem morreu, tendo todas elas os mesmos direitos e deveres. A mulher não tinha direito algum sobre seu marido, o divórcio não tinha limite definido, a poligamia também não tinha número definido. Quando o homem morria e tinha esposa e filhos de outra mulher, o filho maior tinha mais direito sobre a esposa de seu pai que outras pessoas, ele a considerava uma herança igual aos outros bens de seu pai[8].
Prática pré-islâmica do infanticídio feminino
O ódio pelas crianças de sexo feminino chegou ao ponto de enterrá-las vivas, um dos mais hediondos costumes da jahiliah. E se a menina recém nascida se salvasse do enterro viva, geralmente esperava uma vida injusta. O Alcorão Sagrado apresentou esta situação quando Allah, o Altíssimo, disse: “E quando a um deles se lhe alvíssara o nascimento de uma filha, torna-se-lhe a face enegrecida, enquanto fica angustiado. Esconde-se do povo, por causa do mal que se lhe alvissarou. Retê-lo-á, com humilhação, ou soterrá-lo-á no pó? Ora, que vil o que julgam!” (Annahl 58-59).
Assim era a situação na Península Arábica antes do envio do mensageiro de Allah (a paz esteja com ele).
[1] Jauad Ali: A história dos árabes antes do Islam em detalhes, 1/37.
[2] Abu Al Hassan Al Nadawi: O que o mundo perdeu com a decadência dos muçulmanos, p. 76,77.
[3] Al Bukhari: Kitab Al Maghazi (Livro de expedições), (4117).
[4] Abu Al Munzhir Hisham ibn Muhammad ibn Al Saib Al Kalbi: Livro dos Ídolos, p. 44.
[5] Veja: Safyi Al Din Al Mubarakfuri: Al Rahiq Al Makhtum, p. 47.
[6] Veja: Al Tabari: Jami’Al Baian fi Ta’uil Al Qur’an 10/573. E Al Adhim Abadi: Aun Al Ma’bud 10/79.
[7] Al Bukhari: Kitab Al Nikah (Livro sobre Casamento), (4829). E narrado por Abu Daud (2272).
[8] Veja: Muhammad Ahmad Ismail Al Muqdim: A mulher entre a nobreza do Islam e a humilhação da jahiliyah, p. 57.