Os Filhos... Direitos e Deveres
Dr. Ragueb El Serjani
Tradução: Sh. Ahmad Mazloum
Os filhos e a influência do ambiente na educação deles
Os filhos no Islam são o floreio da vida terrena e seu enfeite, são a alegria da alma e o deliciar dos olhos. O Islam tem zelo exclusivo pelos filhos, por isso, a lei islâmica estabeleceu direitos e deveres para os filhos em relação aos pais.
A primeira imagem da vida que se forma no espírito do filho está influenciada pelo ambiente de seus pais. Aprendemos isso pelo que é narrado da palavra do profeta (a paz esteja com ele): “Todo recém nascido nasce na fitrah (estado natural), então seus pais o fazem judeu, cristão ou zoroastriano”[1]. Portanto, os pais tem grande influência na religião e na conduta dos filhos, por isso a virtude dos filhos e o futuro da nação depende muito da integridade dos pais. Baseando-se nisso, os direitos dos filhos antecedem o nascimento, onde temos a escolha da mulher virtuosa e do pai virtuoso, como esclarecemos anteriormente.
Os direitos dos filhos antes de seu nascimento
Protegê-lo do Satanás
Depois de os cônjuges serem guiados para a boa escolha de seu respectivo parceiro, vem o direito da criança de ter a proteção do Satanás. Isto é demonstrado pelo profeta ao recomendar a prece antes do ato sexual. Ibn Ábbass narra que o profeta (a paz esteja com ele) disse: “Quando alguém de vós se unir à sua esposa diz: ‘Em nome de Allah, ó Allah nos evite o Satanás, e evite o que nos der (de filho) o Satanás’” e for decretado entre vós um filho, ele não o prejudicará”[2].
Direito à vida
E quando torna-se um feto dentro do útero materno o Islam lhe dá o direito a vida, pois a lei islâmica proíbe o aborto do feto porque é uma responsabilidade depositada por Allah em seu útero. Este feto tem direito a vida, por isso não é permitido lesá-lo ou prejudicá-lo. A lei islâmica o considera uma pessoa que não pode ser morta ao se passarem quatro meses de gestação e for soprado o espírito nele, e tornou obrigatória a indenização (addiah) sobre quem matá-lo. Al Mughirah ibn Shu´ubah disse: “Uma mulher atingiu outra mulher grávida com um pilar e a matou junto com seu feto”. Levaram o caso até o profeta (a paz esteja com ele), e um homem da família da assassina disse: “Pagaremos indenização de quem não come nem bebe e nem veio ao mundo?” O profeta (a paz esteja com ele) disse: “Sotaque igual o sotaque dos beduínos[3]”[4]. E sentenciou a libertação de um escravo[5] e o tornou obrigatório sobre a tribo da mulher.
A lei islâmica também permitiu a quebra do jejum durante o mês de Ramadan para a mulher grávida como proteção da saúde do feto, assim como permitiu a prorrogação da punição do adultério até que o feto nasça e conclua o período de amamentação.
Os direitos dos filhos depois de seu nascimento
Quanto à fase pós nascimento, o Islam estabeleceu para os filhos regras relacionadas ao seu nascimento, entre elas:
- A recomendação de se alegrar com a boa notícia em seu nascimento, conforme foi mencionado por Allah sobre o nascimento de João Batista filho de Zacarias (a paz esteja com ambos): “Então, os anjos chamaram-no enquanto orava, de pé no oratório: “Allah alvíssara-te o nascimento de Yahia (João Batista), confirmador de um Verbo de Allah, e será senhor, e casto, e profeta entre os íntegros” (Ali Imran: 39). Esta boa nova é igual para o sexo masculino e feminino sem diferença alguma entre eles.
- Fazer o azhan (chamamento para a oração) em seu ouvido direito e a iqamah (chamado para a realização da oração) em seu ouvido esquerdo, seguindo o exemplo do profeta (a paz esteja com ele), que fez o azhan no ouvido de Al Hassan ibn Ali (seu neto) quando ele nasceu. É narrado por Ubaidullah ibn Abi Rafií que seu pai disse: “Eu vi o mensageiro de Allah (a paz esteja com ele) fazer o azhan para a oração no ouvido de Al Hassan ibn Ali quando Fátima deu a luz a ele”[6].
- A recomendação de se fazer tahnik com tâmaras[7], como fez o profeta (a paz esteja com ele). É narrado que Abu Mussa[8] disse: “Nasceu um filho meu, então o trouxe até o profeta (a paz esteja com ele), ele lhe deu o nome de Ibrahim e lhe fez tahnik com tâmara, fez preces a ele para abençoá-lo e o devolveu a mim”[9].
- Raspar o cabelo de sua cabeça e doar o equivalente ao seu peso em prata. Nisso há benefícios para a saúde e para a sociedade. Dentre os benefícios para a saúde: a abertura dos poros da cabeça, retiras as moléstias, e isto pode ser uma retirada de pelos fracos para nascerem em seu lugar pelos fortes. E quanto ao benefício social, este está na doação do peso do cabelo em prata, carrega o significado da solidariedade social e geração de alegria para os mais pobres. Sobre isso é narrado por Muhammad ibn Ali ibn Al Hussain: “Fátima, filha do mensageiro de Allah (a paz esteja com ele) pesou os cabelos de Al Hassan e de Al Hussain e doou o seu peso em prata”[10].
- O direito a uma denominação com bom nome. É obrigação dos pais escolher para o recém nascido um bom nome com o qual será chamado entre as pessoas, um nome que lança o conforto sobre a alma e a tranqüilidade no sobre o coração. O mensageiro (a paz esteja com ele) detestava a palavra harb (guerra) e não gostava de ouvi-la. É narrado que ele disse: “Os nomes mais queridos para Allah: Abdullah e Abdurrahman. E os nomes mais verdadeiros: Harith e Hammam. E os nomes mais horríveis: Harb e Murrah”[11].
E é narrado por Ali:
Quando Al Hassan nasceu lhe dei o nome de Harb. Então, o profeta (a paz esteja com ele) chegou e disse: “Deixem-me ver o meu filho. Que nome deram-lhe? Eu disse: Harb. O profeta (a paz esteja com ele) disse: “Porém, ele é Hassan”. E quando nasceu Al Hussein lhe dei o nome de Harb. O profeta (a paz esteja com ele) chegou e disse: “Deixem-me ver o meu filho. Que nome deram-lhe? Eu disse: Harb. O profeta (a paz esteja com ele) disse: “Porém, ele é Hussain”. E quando nasceu o terceiro eu lhe dei o nome de Harb, então o profeta (a paz esteja com ele) chegou e disse: “Deixem-me ver o meu filho. Que nome deram-lhe? Eu disse: Harb. O profeta (a paz esteja com ele) disse: “Porém, ele é Muhassin”, e disse em seguida: “Lhes dei os nomes dos filhos de Harun: Shabbar, Shabir e Mushabbir”[12]. Também, entre os direitos dos filhos depois do nascimento:
- Al áqiqah, que é o abate de um cordeiro pelo recém-nascido no sétimo dia. É regrada como sunnah muákkadah, e é um gesto de felicidade e alegria por este recém nascido. O profeta (a paz esteja com ele) foi perguntado sobre al áqiqah e disse: “Não gosto da desobediência (úquq), e que tiver um recém-nascido e desejar abater (um cordeiro) por ele que o faça para o menino duas ovelhas e para a menina uma ovelha”[13].
- O direito à amamentação (ao leite materno). A amamentação é uma ação que tem sua influência a longo prazo na formação física, emocional e social na vida do ser humano enquanto recém nascido e, em seguida, criança. Isto foi compreendido pela Lei islâmica, que estabeleceu como dever sobre a mãe amamentar o seu filho durante dois anos completos, tornando-se um dos direitos da criança. Disse Allah, o Altíssimo: “E as mães amamentam seus filhos, por dois anos inteiros. Isso, para quem deseja completar a lactação. E impende ao pai o sustento e o vestir delas, convenientemente” (Al Baqarah: 233).
As pesquisas médicas e psicológicas modernas comprovaram que o período de dois anos é necessário para o desenvolvimento da criança saudavelmente do aspecto médico e psicológico[14], ainda que a graça de Allah e Sua generosidade não tenham esperado os resultados das pesquisas e experiências científicas feitas nos laboratórios de psicologia, mas se antecederam a isso tudo. Assim, observamos a extensão da atenção da lei islâmica com a amamentação e sua determinação em torná-la um direito da criança, porém cabe ressaltar que este dever não é exclusivo da mãe, pois há uma responsabilidade que recai sobre o pai. Essa responsabilidade está representada na obrigação de abastecer a mãe com alimentação e veste para ela poder se dedicar para a assistência e alimentação de seu filho. Assim, ambos cumprem a sua missão dentro do círculo que a lei islâmica traçou a cada um deles, preservando o benefício da criança cuja assistência e proteção foram encarregados de cumprir, sendo que isso deve ocorrer dentro dos limites de suas capacidades e condições. Disse Allah, o Altíssimo: “Allah não impõe a alma alguma senão o que é de sua capacidade” (Al Baqarah: 286).
- O direito à criação e a mantimento. A lei islâmica fez obrigação dos pais a assistência aos filhos, a preservação de suas vidas e saúde e sustento. Disse o profeta (a paz esteja com ele): “Todos vós sois pastores e sois responsáveis por vossos rebanhos. O governante é pastor e é responsável por seu rebanho, o homem dentro de sua família é pastor e é responsável por seu rebanho, a mulher na casa de seu esposo é pastora e é responsável por seu rebanho, e o servo na riqueza de seu patrão é pastor e é responsável por seu rebanho...”[15].
- O direito à boa educação e ao ensino dos assuntos necessários da religião. Mostrando uma maneira prática na educação aos filhos, o mensageiro (a paz esteja com ele) diz: “Ordenem vossos filhos a oração com sete anos, e batam-nos por causa dela aos dez anos. E dividam entre eles nos leitos”[16]. Allah também nos ordenou proteger a nós e aos nossos filhos do fogo do Inferno não dia da ressurreição dizendo: “Ó vós que credes, protegei a vós e às vossas famílias do fogo cujo combustível serão as pessoas e as pedras” [Attahrim 6].
- Além disso, é obrigatória a assistência emocional aos filhos, através da benfeitoria e misericórdia a eles, animando-os e brincando com eles. Sobre isso, é narrado que o mensageiro (a paz esteja com ele) beijou Al Hassan ibn Ali quando Al Aqraá ibn Habiss estava com ele. Então, Al Aqraá disse: “Tenho dez filhos, e nunca beijei nenhum deles”. Então, o mensageiro (a paz esteja com ele) olhou para ele e disse: “Quem não tem misericórdia, não se terá misericórdia com ele”[17].
Shaddad ibn Al Had narra que o seu pai disse: O mensageiro de Allah (a paz esteja com ele) saiu ao nosso encontro na oração do magrib ou do íshaá carregando Hassan ou Hussain.
O mensageiro de Allah (a paz esteja com ele) se adiantou, colocou-o no chão e fez o takbir, iniciando a oração e, durante a oração fez uma prostração muito demorada, então, levantei a minha cabeça e vi o menino sobre as costas do mensageiro de Allah (a paz esteja com ele) quando ele estava prostrado, então retornei à minha prostração. Quando o mensageiro de Allah (a paz esteja com ele) finalizou a oração, as pessoas disseram: “Ó mensageiro de Allah, o senhor fez uma prostração muito longa durante a oração a ponto de pensarmos que ocorreu algo ou está sendo revelado algo a ti”. O profeta (a paz esteja com ele) disse: “Nada disso aconteceu, mas o meu filho montou sobre mim, e detestei apressá-lo antes dele concluir o que queria”[18].
E Anass ibn Malik narra que o mensageiro de Allah (a paz esteja com ele) disse: “Eu entro na oração desejando alongá-la, mas ouço o choro do menino, então abrevio a minha oração pelo que conheço da intensidade do sentimento de sua mãe por causa de seu choro”[19].
A educação das meninas
Além disso, a boa educação e a assistência dedicadas às meninas têm importância exclusiva, a ponto de o mensageiro (a paz esteja com ele) multiplicar a recompensa de quem bem educa exclusivamente as meninas. Disse o profeta (a paz esteja com ele): “Quem cuidar de duas meninas até atingirem a idade da puberdade virá no dia da ressurreição eu e ele” e uniu entre seus dedos[20].
Assim sendo, os filhos tiveram direitos garantidos pelo Islam, os quais superaram todos os regulamentos e leis do ser humano em sua abrangência e etapas. Isto ocorreu porque o Islam zelou pelos filhos em todas as etapas de suas vidas, quando fetos, lactentes, crianças, jovens, até chegarem à etapa de adultos, homens e mulheres, ainda mais, zelou por eles antes de serem fetos nos úteros de suas mães, através da escolha correta de seus pais e mães... Isso tudo, com o objetivo de formar homens e mulheres certos para uma sociedade onde predomina a moral e os valores civis nobres.
[1] Al Bukhari da narração de Abu Hurairah (6226), e Muslim (22).
[2] Al Bukhari (4767), e Muslim (1434).
[3] Os estudiosos dizem que: "O Profeta criticou a frase dita por este homem por duas razões: Primeiro, porque ele se opôs à lei de Deus e queria anulá-la. E segundo, porque ele dissimulou e fingiu o seu discurso. Os dois aspectos são considerados impróprios. Veja: Al-Nawaui: Al Minhaj Fi Sharh Sahih Muslim Ibn Al Hajjaj 11/178.
[4] Al Bukhari: Kitab at-Tib (Livro de Medicina) (5426), Muslim (1682), Abu Daud (4568), Annassaí (4825), Ibn Hibban (6016), e autenticado por Al Albani.
[5] Veja: Al-Nawaui: Al Minhaj Fi Sharh Sahih Muslim ibn Al Hajjaj (O Sistema na Interpretação da Coletânea de Muslim ibn Al Hajjaj) 11/175, 176.
[6] Abu Daud: Kitab al Adab (5107) e Al Albani disse: Este é um hadith autêntico, veja: Sahih wa Dha'eef Sunan Abi Daud (5105).
[7] Significa colocar tâmaras mastigadas na boca do recém-nascido. Estudos científicos médicos provaram que a maioria ou todos os recém-nascidos precisam de açúcar (glicose) logo depois do nascimento. O percentual de glicose é baixo no sangue de recém-nascidos, e a tâmara contém uma quantia muito elevada de açúcar. Portanto, dar tâmara derretida para o recém-nascido o protege, com a permissão de Allah, da elevação de falta de açúcar, e é um milagre médico científico, pois a humanidade não conhecia os perigos da baixa de glicose no sangue do recém-nascido. Para obter mais informações sobre os aspectos deste milagre, veja: Dr. Muhammad Ali Al Bar: Artigo “O cuidado com a infância no Islam”: introduzir tâmara mastigada na boca de uma criança recém-nascida e seu milagre científico, Orgnização Internacional de Estudos dos Milagres Científicos no Alcorão e na Sunnah. Link: http://www.nooran.org/O/4/4O11.htm
[8] Abu Musa al Ashaari: Abdullah ibn Qais ibn Salim ibn Hadhar ibn Harb ibn Amer, companheiro do profeta Muhammad. O Profeta o nomeou como governador de Zubaid e Aden. E era o governador de Kufa. Veja: Ibn Saad: At-Tabaqat Al-Kubra (O Livro das principais classes) 4 / 105, e Al-Zhahabi: Siar A'lam Al Nubala'a (As Vidas das nobres figuras) 2 / 380.
[9] Al Bukhari: Kitab al Aqiqah (sacrifício na ocasião do nascimento da criança) (5045), e Muslim: Kitab al Adab (boas maneiras) (3997).
[10] Relatado por Malik em Al Muwata, Kitab al Aqiqah (sacrifício na ocasião do nascimento da criança) (1840).
[11] Abu Daud (4950), Annassaí (3568), Ahmad (19054), al Bukhari, em seu livro Al Adab Al Mufrad (O Livro de Boas Maneiras) (814). Al Albani disse: Este é um hadith autêntico, As-Silsilah As-Sahihah, (1040).
[12] Ahmad (769), Malik (660), Ibn Hibban (6958), al Hakim (4773) e al Bukhari em Al Adab al Mufrad (O Livro de Boas Maneiras) (823).
[13] Abu Daud: Kitab Adhahaya (Livro dos Sacrifícios), capítulo Aqiqah (sacrifício na ocasião do nascimento) (2844), Ahmad (6822). Veja: Al-Silsilah Al-Sahihah (1655).
[14] A amamentação natural durante 12 meses, pelo menos, mas é melhor seguir as recomendações da Organização Mundial de Saúde para o aleitamento materno por dois anos inteiros. Veja: Hassan Shamsi Basha: aleitamento materno por dois anos inteiros, um artigo no link abaixo: http://dvd4arab.maktoob.com/showthread.php?t/60832
[15] Al Bukhari de Abdullah Ibn Umar: Kitab al Ítq (Livro de libertação), (2416) e Muslim (1829).
[16] Abu Daud: Kitab Al Salat (Livro de Oração) (495), Ahmad (6689), al Hakim (708) e Al Albani disse: Um hadith autêntico, veja: Sahih al Jami’ (4026).
[17]Al Bukhari: Kitab Adab al (Livro de Boas Maneiras), o capítulo ter misericórdia sobre o menino, beijando e acariciando-o (5651), e Muslim: Kitab al Fadha'il (Livro das Virtudes), o capítulo Misericórdia Profeta com as Crianças (2318).
[18] Annassaí (1141), Ahmad (27.688), al Hakim (4775) e foi corrigido por az-Zahabi, Ibn Khuzaima (936), Ibn Hibban (2805).
[19] Al Bukhari: Kitab Al Jamaa Wal Emama (Livro das características de Oração) (677), Ibn Maja (989), Ibn Khuzaima (1610), Ibn Hibban (2139), Ya'la Abu (3144) e Bayhaqi al em seu Shu'ab Iman Al (Ramos da Fé) (11.054).
[20] Muslim: Kitab Al-Birr Was-Silah- wal-Adab (O livro das virtudes, boas maneiras e união dos laços de parentesco), capítulo fazendo um favor para Meninas (2631), e o texto é dele, Al-Tirmizi (1914), Al Hakim (7350), e al Bukhari em seu Al Adab Al Mufrad (Livro de Boas Maneiras) (894).